Entrei apressado e com muita fome no restaurante. Escolhi
uma mesa bem afastada do movimento, pois, queria aproveitar os poucos minutos
que dispunha naquele dia atribulado, para comer e planejar minha viagem de férias da faculdade
que a tempos planejo com minha esposa.
Pedi um filé de salmão com alcaparras na manteiga uma salada
e um suco de laranja, afinal de contas, fome é fome, mas regime é regime. Abri
meu laptop e levei um susto com aquela voz baixinha atrás de mim.
- Tio, dá um trocado?
- Não tenho, menino.
Só uma moedinha para
comprar um pão.
- Está bem, compro um para você.
Para variar, minha caixa de entrada está lotada de e-mails.
Fico distraído vendo as postagens, as formatações lindas, dando risadas com as
piadas malucas no facebook.
- Tio, pede para colocar margarina e queijo também.
Percebo que o menino tinha ficado ali.
- Ok. Vou pedir, mas depois me deixa trabalhar, estou muito
ocupado, tá?
Chega minha refeição e junto com ela meu constrangimento.
Faço o pedido do menino, e o garçom me pergunta se quero que mande o garoto ir
“a luta”.
Meus resquícios de consciência, me impedem de dizer. Digo
que está tudo bem. Deixe-o ficar. Que traga não o pão, mas uma refeição decente
para ele. Então ele sentou à minha frente e me perguntou:
- Tio que você tá fazendo?
Estou lendo uns
e-mails.
O que são e-mails?
- São mensagens eletrônicas mandadas por pessoas via
Internet.
Sabia que ele não ia entender nada, mas, a título de
livrar-me de maiores questionamentos disse:
- É como se fosse uma carta, só que vem pela Internet.
- Tio, você tem Internet?
- Tenho sim, essencial ao mundo de hoje.- O que é Internet?-
É um local no computador, onde podemos ver e ouvir muitas coisas, notícias,
músicas, conhecer pessoas, ler, escrever, sonhar, trabalhar, aprender. Tem de
tudo no mundo virtual.
- E o que é virtual?
Resolvo dar uma explicação simplificada, novamente na
certeza que ele pouco vai entender e vai me liberar para comer minha refeição,
sem culpas.
- Virtual é um local que imaginamos, algo que não podemos
pegar, tocar. É lá que criamos um monte de coisas que gostaríamos de fazer.
Criamos nossas fantasias, transformamos o mundo em quase como queríamos que ele
fosse.
- Legal isso. Adoro!
- Mocinho, você entendeu o que é virtual?
- Sim, também vivo neste mundo virtual.
- Você tem computador?
- Não, mas meu mundo também é desse jeito... virtual.
Minha mãe trabalha, fica o dia todo fora, só chega muito
tarde e quase não a vejo, eu fico cuidando do meu irmão pequeno que vive
chorando de fome e eu dou água para ele pensar que é sopa, minha irmã mais
velha sai todo dia, diz que vai vender o corpo, mas não entendo pois ela sempre
volta com o corpo, meu pai está na cadeia há muito tempo, mas sempre imagino
nossa família toda junta em casa, muita comida, muitos brinquedos, dia de natal
e eu indo ao colégio para virar médico um dia.
- Isso é virtual não é tio?
Fechei meu laptop, não antes que lágrimas caíssem sobre o
teclado. Esperei que o menino terminasse de literalmente “devorar” o prato
dele, paguei a conta e o troco dei para o garoto, que me retribuiu com um dos
mais belos e sinceros sorrisos que já recebi na vida e com um “brigado tio você
é legal!”.
Ali, naquele instante, tive a maior prova do virtualismo
insensato em que vivemos, todos os dias, enquanto a realidade cruel nos rodeia
de verdade e fazemos de conta que não percebemos!
“A causa real da maioria dos nossos grandes problemas está
entre a ignorância e a negligência”. - Goethe
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