Uma vizinha sempre
que a gente se encontra gosta de me
lembrar quanto pareço feliz desde que me casei. A gente se encontra em reuniões
de família e ela, invariavelmente, observa que continuo
com o sorriso dos homens apaixonados. Eu rio, embaraçado e contente, e
conversamos um pouquinho. Além de gentil e afetuosa, minha vizinha é romântica.
Ela perdeu o marido há pouco tempo, depois de um casamento de 30 anos, e
projeta nas pessoas ao redor um pouco da felicidade que viveu. Ao agir assim,
de maneira tão doce, ela me lembra que as pessoas dão ao mundo aquilo que
receberam. Pode ser amor e gentileza, pode ser o contrário. Isso é muito claro
quando a gente entra na intimidade de um relacionamento. Em pouco tempo,
começamos a perceber do que a outra pessoa é feita.
A experiência sugere
que a gente não escolhe por que tipo de pessoa se apaixonará. Quando se dá
conta, já aconteceu - e estamos envolvidos, até o pescoço, com alguém que pode
ser muito difícil de amar, por ter as piores experiências no assunto. Nenhum de
nós tem currículo perfeito nesse tema.
Tendo vivido e convivido com pessoas muito diferentes, me é
claro como a experiência amorosa produz
diferentes atitudes diante do amor - e como essas atitudes são modificadas
pelas experiências da vida adulta. Quando começamos a nos relacionar
eroticamente, somos adolescentes. Levamos para os braços do outro, quase
intactas, nossas questões infantis e familiares. À medida que a gente cresce e
vai tendo outras experiências, os sentimentos evoluem. Ninguém está pronto e
acabado aos 20 ou aos 40 anos. Nem aos 70, acho.
A impressão de não ser a criança mais amada do mundo pode
diminuir ou aumentar nos primeiros envolvimentos. A sensação adolescente de ser
o centro das atenções ou de ser rejeitado pelo mundo pode ser negada ou
confirmada por um grande amor. O medo e a insegurança podem ser ampliados numa
sequência de relações instáveis, ou reduzidos por um relacionamento intenso,
seguro e duradouro. A vida não para de nos formar. Quem a gente escolhe para
estar a nosso lado tem papel fundamental nessa formação.
Por isso tudo, a atitude da minha vizinha me parece tão
bonita. Ela sabe, por ter vivido, que as pessoas se transformam pela
experiência do amor. eu acabara de ter uma briga estúpida e desnecessária com
minha mulher. A conversa com minha vizinha , na saída para trabalho, me ajudou
a lembrar quanto gosto e quanto essa relação é importante para mim. Horas
depois, peguei o telefone e liguei para pedir desculpas. Talvez fizesse isso de
qualquer maneira, mas gosto de pensar que minha vizinha me ajudou a lembrar que
fazer as pazes era urgente e necessário.
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