segunda-feira, 19 de novembro de 2012

PROVEDORES



As coisas que você se lembra de uma paixão antiga são aquelas que aconteceram no começo. Primeiras conversas, primeiro sexo, primeira viagem, primeira vez na casa da familia, mais que de eventos: a expectativa, as surpresas, o prazer de conquistar e ser conquistado. Por alguma razão, esses momentos inaugurais ficam gravados na memória como uma espécie de trauma feliz. Eles se tornam a nossa referência, uma régua existencial contra a qual comparamos o que vem depois: maior, igual, melhor, diferente...Para o nosso azar,  depois que nos metemos numa relação estável. Acasalados, nós temos amor, cumplicidade, transamos de forma intensa e regular. Nada, rigorosamente, nos faz falta. Mas a memória, como um farol oceânico quebrado, segue mandando flashes periódicos sobre os velhos tempos – e nós, miseravelmente, somos obrigados a admitir que aquela intensidade nos faz falta. Imagina uma mulher que tem trinta e oito anos, gostaria de casar e ter filhos, mas o homem por quem está apaixonada não tem onde cair morto. É um sujeito culto, inteligente, idealista, sem a menor vocação para ganhar dinheiro. Mora num apartamento minúsculo e parece feliz em andar de ônibus e comer fora em lugares baratos, apesar de estar chegando aos 40 anos.
O pai dela foi um provedor dedicado e um marido amoroso, que criou as filhas com desvelo, para viver e casar bem. Ela admite que, no fundo, gostaria de encontrar um homem prático e bem sucedido como o pai para começar sua própria família, mas, ao mesmo tempo, sente que ama o professor de olhos tristes. Se eles vierem a casar, está claro que viverão do salário dela, que é bom. Ela hesita. Diante da possibilidade de se tornar a provedora da casa, a primeira na história da sua família, ela morre de medo. Não era bem assim que começava a história do Príncipe Encantado.
O homem que não sabe ganhar dinheiro, mas tem seu trabalho e seus valores, pode ser o melhor marido e o melhor pai do mundo, assim como, através dos séculos, muitas das melhores mães e companheiras do mundo nunca ganharam um tostão furado. Um homem sem dinheiro pode ser amoroso, generoso, gentil com as pessoas e cuidadoso com as coisas. Pode ser ativo, espirituoso, cheio de vida, capaz de boas atitudes e bons sentimentos. Se não for vagabundo ou ressentido, pode ser um ótimo exemplo para os filhos – exemplo de que o dinheiro e o sucesso material não são a coisa mais importante da vida, exemplo de que há outros valores além dos que o dinheiro é capaz de comprar.
Talvez não haja muitas mulheres dispostas a bancar um homem desses, porém. A maioria talvez prefira a relação com um tipo convencional, com mais jeito de provedor. Esse negócio de ser o chefe econômico da casa, afinal, não é moleza. O estresse que vem com a posição é enorme, dura décadas, e no final rouba uns 10 anos de vida de quem o abraça. É um preço que os homens vêm pagando há muitas gerações. Eles escolhem a mulher com base apenas nos seus sentimentos e desejos, sabendo que terão de trabalhar duro, provavelmente pelo resto da vida, para cuidar da família que fizerem com ela. Não é uma opção fácil, como a mulheres vem percebendo, mas tem suas gratificações. Exige coragem, porém. No caso das mulheres, a coragem adicional de desafiar convenções e de romper com os preceitos da própria cabeça

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