Outro dia tive insônia, abri a janela às duas da manhã e dei
de cara com uma mulher adulta pulando diante da TV, na casa da frente. Parecia
interagir com um videogame. Ela fazia movimentos coreografados, iluminada pela
luz da tela. O espetáculo durou meia hora. Depois, ela apagou a luz e foi
dormir, imagino. Eu, que me preparava para ler um livro, senti que era um ser
humano superior. Serei? Suspeito que não. A insônia dela parecia mais divertida
que a minha. Certamente era mais animada que a insônia dos marmanjos que
entorpecem neurônios e ganham barriga vendo TV de madrugada ou ouvindo tango argentino.
Diante desse quadro melancólico, recomendo tolerância com os
homens porque eles se apaixonam instantaneamente por gente que acabam de
conhecer. Confundem simpatia com reciprocidade. Não notam sinais de que as
pessoas são casadas ou indisponíveis. No afã de encher o vazio interior, podem
encher o saco dos outros e tornar-se patéticos.
Neste universo dominado pelo tempo e pelas circunstâncias
que ele cria, os gestos são fundamentais. Gestos claro de aproximação e de
afastamento. Eles constroem a sorte. Fazem com que as janelas se transformem em
oportunidades concretas. Permitem que o amor deixe de ser uma possibilidade
latejante no futuro para se tornar algo presente. Não sabemos quando o destino
vai nos abrir uma janela, mas nos cabe decidir, agora, o que fazer diante dela.
O amor, como tantas outras coisas, depende de oportunidades.
A pessoa que hoje vira do avesso a minha vida, em outro momento poderia ter
passado sem ser notada. Bastaria que houvesse alguém ocupando meus sentimentos.
Ou satisfatoriamente a minha cama. Eu estaria indisponível aos apelos do amor.
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