domingo, 21 de abril de 2013

NO ROSTO DELA EU VI


Vivemos numa época onde o amor tem o mesmo peso de uma bolacha de água e sal sobre a mesa. Onde o que importa deixou de ser importante e escapa entre os dedos de quem ainda mantém a esperança de conservar os sentimentos – a partir dos farelos daquilo que sobrou. Estamos vivendo numa época onde o amor perdeu o seu espaço para as superficialidades. O romantismo mudou de casa. Desistiu. Despareceu das relações. Os romances duram uma noite e só. Romances de pó. As declarações se perdem do verdadeiro afeto e restringem-se às mensagens publicadas em redes sociais, que não atravessam os limites da tela fria de um computador; não tocam o outro; não despertam quase nada além de um frisson que dura o tempo de um banho. Palavras sem nenhum conteúdo verdadeiro que vão se sobrepondo àquilo que no passado tinha algum valor, como um carinho, um beijo, um bilhete em letra cursiva, estrategicamente deixado nos pertences do outro; um abraço de saudade, uma despedida comovida, a esperança do reencontro no dia seguinte. Tudo isso perdeu o sentido para palavras sem qualquer vigor, que não aquecem, que não significam nada além de palavras bonitas, perdidas num amontoado de versos bem feitos, sem valor e intenção verdadeira, que no final do dia viram arquivos digitais, deletados da memória da realidade.
As pessoas estão perdendo a noção, o sentido e a direção. Estão perdendo tudo para o descabimento. Estão se perdendo umas das outras e estão se acostumando com isso. Estão desacreditando. Estão desacreditadas.
Mas, apesar dessa descrença generalizada; dessa banalização sentimental e, apesar da frouxidão nos desejos que não saem do papel, ainda há aqueles que se recusam a viver de amores banho-maria. Como nós. Somos àqueles a espera de amores que imprimam palavras na pele. Amores que tenham gosto, saliva, arrepios.
Não queremos viver de amores líquidos. Amores que nos escorram entre os dedos e se faça invisível. Queremos o toque. Amores que não molhem nossos olhos, sem antes molhar a nossa boca. Queremos sentimentos que durem estações e criem raízes. Amores que fiquem para o jantar. Já estamos exaustos de uma rotina vazia, dos amores caóticos, temporais; amores fumaça que queimam e desaparecem no ar. Queremos um amor que tenha sono e repouse em nosso colo. Amor sólido. Que confie no caminho a dois e não fuja, logo após o primeiro desentendimento. Que abrace sem a rapidez e a rispidez de hoje em dia. Que tenha disponibilidade no seu verbo amar e queira ser conjugado em todos os seus tempos. Queremos um amor que não se recuse, que não corra, que não chute com os seus pés velozes o nosso castelo de areia. Queremos um amor que se entregue. Que se prenda. Que se doe e não se peça de volta. Que queira ser amor eterno, ainda que seja eterno enquanto dure. Queremos amor real, e que a realidade, ainda que não seja leve o tempo todo, ainda que não sustente o romantismo em tempo integral, seja no mínimo mais interessante e colorida do que essa forma vazia e equivocada de amar que estamos vivendo.

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