Até ontem, eu não sabia da existência da dupla sertaneja Max
e Mariano. . Os dois saltaram de Goiás para a infâmia nacional, com o clipe de
uma música chamada “Eu vou jogar na internet”. A letra da música explica a
confusão em que se meteram:
“Semana passada mesmo a gente ficou. E, sem que você
percebesse, eu gravei de nós dois um vídeo de amor. Eu vou jogar na internet,
nem que você me processe. Eu quero ver a sua cara quando alguém te mostrar,
quero ver você dizer que não me conhece”.
A tempestade que caiu sobre a cabeça enchapelada dos
apologistas do crime nos dá alguma esperança no Brasil, mas é pequena. Embora
eles tenham sido massacrados nas redes sociais e lembrados até no Congresso –
onde o senador Romário defende a criação de uma lei específica contra a exposição
da intimidade alheia na internet – eu não tenho dúvida que no grande sertão da
misoginia onde esses caras brotaram há muito mais gente que pensa como eles,
homens e mulheres capazes de cometer de alma leve o crime que eles celebram e
incentivam com a sua música ruim.
Quando se trata de respeito e consideração pelas mulheres, o
Brasil é uma catedral do atraso. Algumas leis são bacanas, mas os costumes são
medonhos.
Outro dia, uma moça que eu conheço quase foi agredida numa
balada por se recusar a conversar com um sujeito que achara ela bonita. O cara
a agarrou pelo braço e teve de ser afastado por outros homens, depois de
enfrentar as amigas dela que tentavam expulsá-lo. Isso é um exemplo de conduta
criminosa tristemente comum.
No caso da moça que eu conheço, havia por perto homens
dispostos a correr o risco de enfrentar o marginal e defendê-la. Nem sempre
esse tipo de cavalheirismo e de coragem estão disponíveis. Os canalhas
frequentemente saem impunes de agressões públicas contra as mulheres, quando
deveriam ser retirados sob escolta do local, levados à delegacia e indiciados
como agressores sexuais.
Agarrar uma mulher estranha pelo braço e tentar forçá-la ao
que quer que seja - “Me dá um beijo,
senão eu não te largo!” - é uma forma de agressão sexual. Comprovada na
justiça, ela deveria ficar na ficha policial do jovem musculoso para que seus
futuros empregadores saibam como ele pode ser obstinado.
Depois de duas latas de cerveja, jovens da melhor classe
média brasileira sentem que podem se impor fisicamente às mulheres que desejam.
Passam a mão, puxam o cabelo, agarram. Alguns insultam e dão porrada quando
recusados. Como esse tipo de comportamento não brota do nada, deve haver gente
ao redor deles dando exemplo - ou sendo leniente com seus meninos.
Por isso eu acho a cultura brasileira misógina: o
comportamento escroto em relação às mulheres é socialmente tolerado em todas as
classes sociais e geografias, embora em toda parte seja coisa de minoria.
A resposta é simples: a mesma sociedade em que uma dupla
sertaneja grava uma música incentivando o pornô de vingança. A mesma em que
moleques mimados agridem as garotas impunemente. A mesma em que o machismo
prolifera, insidioso, na forma de um profundo e ostensivo desrespeito pelos
direitos mais elementares das mulheres: andar na rua sem ser incomodada, estar
sozinha em público sem ser abordada, dançar com as amigas sem ser agarrada,
dizer não sem ser agredida ou morta. Falamos do Brasil, naturalmente.
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