quarta-feira, 2 de setembro de 2015

HOMEM FERRADURA



Até ontem, eu não sabia da existência da dupla sertaneja Max e Mariano. . Os dois saltaram de Goiás para a infâmia nacional, com o clipe de uma música chamada “Eu vou jogar na internet”. A letra da música explica a confusão em que se meteram:

“Semana passada mesmo a gente ficou. E, sem que você percebesse, eu gravei de nós dois um vídeo de amor. Eu vou jogar na internet, nem que você me processe. Eu quero ver a sua cara quando alguém te mostrar, quero ver você dizer que não me conhece”.

A tempestade que caiu sobre a cabeça enchapelada dos apologistas do crime nos dá alguma esperança no Brasil, mas é pequena. Embora eles tenham sido massacrados nas redes sociais e lembrados até no Congresso – onde o senador Romário defende a criação de uma lei específica contra a exposição da intimidade alheia na internet – eu não tenho dúvida que no grande sertão da misoginia onde esses caras brotaram há muito mais gente que pensa como eles, homens e mulheres capazes de cometer de alma leve o crime que eles celebram e incentivam com a sua música ruim.
Quando se trata de respeito e consideração pelas mulheres, o Brasil é uma catedral do atraso. Algumas leis são bacanas, mas os costumes são medonhos.

Outro dia, uma moça que eu conheço quase foi agredida numa balada por se recusar a conversar com um sujeito que achara ela bonita. O cara a agarrou pelo braço e teve de ser afastado por outros homens, depois de enfrentar as amigas dela que tentavam expulsá-lo. Isso é um exemplo de conduta criminosa tristemente comum.
No caso da moça que eu conheço, havia por perto homens dispostos a correr o risco de enfrentar o marginal e defendê-la. Nem sempre esse tipo de cavalheirismo e de coragem estão disponíveis. Os canalhas frequentemente saem impunes de agressões públicas contra as mulheres, quando deveriam ser retirados sob escolta do local, levados à delegacia e indiciados como agressores sexuais.

Agarrar uma mulher estranha pelo braço e tentar forçá-la ao que quer que seja  - “Me dá um beijo, senão eu não te largo!” - é uma forma de agressão sexual. Comprovada na justiça, ela deveria ficar na ficha policial do jovem musculoso para que seus futuros empregadores saibam como ele pode ser obstinado.
Depois de duas latas de cerveja, jovens da melhor classe média brasileira sentem que podem se impor fisicamente às mulheres que desejam. Passam a mão, puxam o cabelo, agarram. Alguns insultam e dão porrada quando recusados. Como esse tipo de comportamento não brota do nada, deve haver gente ao redor deles dando exemplo - ou sendo leniente com seus meninos.

Por isso eu acho a cultura brasileira misógina: o comportamento escroto em relação às mulheres é socialmente tolerado em todas as classes sociais e geografias, embora em toda parte seja coisa de minoria.



 Que tipo de sociedade produz esse tipo de gente? Que tipo de instituições permitem que continuem agindo impunemente por tanto tempo?

A resposta é simples: a mesma sociedade em que uma dupla sertaneja grava uma música incentivando o pornô de vingança. A mesma em que moleques mimados agridem as garotas impunemente. A mesma em que o machismo prolifera, insidioso, na forma de um profundo e ostensivo desrespeito pelos direitos mais elementares das mulheres: andar na rua sem ser incomodada, estar sozinha em público sem ser abordada, dançar com as amigas sem ser agarrada, dizer não sem ser agredida ou morta. Falamos do Brasil, naturalmente.

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