Vistos de perto, somos
uma gente descuidada e bruta no trato íntimo. Há pessoas preocupadas com os
sentimentos dos outros, mas são minoria. No atacado, oferecemos um show coletivo
de descaso e grosserias. A regra principal, que parece única, é assim: se eu
estiver interessado, apaixonado ou com tesão, corro atrás e me desvelo. Se não
estiver, ou se não estiver mais,
azar. O outro será ignorado ou destratado.
Não
estou fazendo uma queixa, embora pudesse. É mais uma autocrítica, inspirada
pelas conversas com gente que vive fora do Brasil ou se relaciona com
estrangeiros. As histórias que me contam fazem notar que temos por aqui pouca
atenção e pouco respeito pelo outro – mesmo por pessoas que dividem seu corpo,
seu tempo e seus sentimentos conosco. Achamos que a atenção e o carinho que
recebemos são uma espécie de direito natural. Logo, não precisam ser
retribuídos. Isso torna as delicadezas supérfluas.
Uma
amiga que mora na Holanda foi transar com um cara de uns 40 anos – depois de
saírem duas vezes – e, quando a noite se aproximava do desfecho, ele perguntou,
delicadamente, se estaria bem para ela que fosse apenas sexo casual. Ele vinha
de um relacionamento, ainda estava ligado a outra mulher e, embora muito
atraído pela minha amiga, não queria magoá-la ou criar expectativas falsas. Um
fofo, me disse ela. Transaram.
A
parte cômica da história é que ela mesma não tinha vontade alguma de namorar,
mas nem lhe passou pela cabeça dar o mesmo aviso. Na mentalidade brasileira, é
cada um por si. A gente não diz coisas que possam atrapalhar nossos planos
imediatos. Pegamos o que precisamos e o outro que se vire com os sentimentos
dele. Se o holandês de minha amiga estivesse apaixonado e cheio de boas
intenções, azar dele. Descobriria no dia seguinte que ela tinha outros planos.
Acho
que isso revela um traço da cultura do país. Somos movidos por sentimentos, não
por valores. Se eu gosto de alguém, se estiver apaixonado, faço por ele ou por
ela o que estrangeiros não fariam. Sempre como um ato emocional. Mas, se os
sentimentos não se manifestam, achamos não ter obrigação alguma para com o
outro. Seja amante, vizinho ou transeunte. Nossa famosa cordialidade é
interessada, interesseira. Aparece quando queremos algo do outro. Sexo ou amor,
frequentemente.
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