sábado, 9 de julho de 2016

PALAVRAS


Às vezes, apesar dos sinais contraditórios e das evidências confusas, apesar do nosso desejo em contrário, precisamos ter coragem de encarar os fatos e perguntar: por que a pessoa que parece me amar na verdade não me ama?
Não é fácil chegar a esse ponto, sabemos.
Nossa tendência é fingir que a pessoa que nos deseja também nos ama.  Só que não. Sexo não quer dizer amor, saudade não quer dizer amor, o afeto que as pessoas têm por nós tampouco significa que nos amem – ao menos não da forma como gostaríamos.
Muitos preferem não notar as contradições nesses sinais. Se agarram aos fiapos de atenção e desejo do outro para tecer uma ilusão pesada e duradoura. Apenas quem consegue olhar através da névoa do autoengano é capaz de enxergar o que realmente acontece e fazer a pergunta difícil do filme: “Por que ele não me ama?”.
A resposta, na verdade, é menos importante do que a pergunta.
Nunca saberemos realmente por que alguém nos quer ou deixou de nos querer. Essas coisas são misteriosas inclusive para quem as sente. As pessoas podem dizer um monte de coisas, apresentar justificativas e fatos, mas não sabem de fato o que aconteceu. Os olhos se cruzam, um coração dispara a bater, no outro não acontece nada. Como explicar? Houve no passado um sentimento intenso e duradouro, mas ele deixou de existir. Por quê? Frequentemente sentimos atração e até carinho, mas eles não se transformam naquela outra coisa, maior, que a gente chama de amor. Qual a razão?
As palavras não dizem muito, e, ainda que digam, não significam nada. É inútil saber por que as pessoas não nos querem ou deixaram de nos querer. O que se faz com essa informação dolorosa?
Por isso, eu prefiro a pergunta.
No momento em que você percebe que não é amado – ou que não é mais amado –, abre-se à sua frente um mundo assustador, mas transitório. Rompida a ilusão, desfeito o pacto subjetivo com o outro, é possível começar de novo, tomar uma atitude, mover-se em alguma direção. A pergunta patética – “por que ele não me ama”? – resume um momento de dor e autopiedade, mas ele é apenas o começo. Depois vem o resto da vida.
No filme, depois de fazer a pergunta difícil e sofrer as consequências, a moça se veste de preto e, elegantemente, sobe num avião para buscar seus sonhos. No mundo real, as coisas não são tão simples, mas se movem na mesma direção. Feita a pergunta fundamental, um mundo novo se abre, as possibilidades se alinham à nossa frente e nos cabe escolher nosso destino. Pode ser Marrocos, São Miguel do Gostoso ou qualquer outro lugar (ou qualquer outra pessoa) que faça disparar o nosso coração ressabiado.


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