Não adianta falar de amor para quem não tem sentimentos para
ouvir. Nem adianta explicar o desamor a quem está apaixonado. As pessoas
continuarão vivendo suas próprias emoções, imunes à lógica das palavras. A
razão se aplica como um freio – não se pode insultar, não se vai agredir, não
se vai detratar ou perseguir quem nos machuca –, mas é incapaz de estancar
sensações ruins. Não há palavras que reparem uma alma ferida. Apenas o tempo
faz isso.
O que as palavras fazem é alimentar o que já existe.
Uma atração estabelecida no subsolo das almas pode crescer
com palavras que a confirmem. Uma conversa de ruptura será decisiva para quem
secretamente deseja partir. Mas, mesmo um mar de palavras não consegue criar
uma paixão do nada, e nem será capaz de destruir aquela que ainda existe. São
os sentimentos – por trás e por baixo das palavras, dentro e fundo no interior
de nós – que realmente importam. A comunicação criada pelas palavras é
supérflua. São as almas que conversam, em silêncio.
Isso nos deixa – vocês percebem? – com uma divisão
interna irreparável. Nossa proposta de convívio se baseia no uso das palavras e
no controle das emoções. Mas, na verdade, são as emoções que nos controlam, sob
a pele fina da racionalidade. E as palavras frequentemente são inúteis.
Explicam, mas não consolam. Iluminam, mas não transformam. Por isso somos
assim: falsos modernos, falsos racionais, falsos equilibrados. Seres
verdadeiramente perdidos em busca de um amor que nos abrigue e silencie em nós
a corrente vã e incessante de palavras.
Racionalidade tem limites. Noto em mim, e nas pessoas a
minha volta, como é difícil manter convicções e princípios quando eles
contrariam nossas emoções. Sobretudo aquelas que envolvem sentimentos amorosos.
Abre-se nessas ocasiões uma distância enorme entre discurso e sensibilidade.
Por conta dela, gente bacana se comporta de maneira inaceitável.
Carlos Drummond de Andrade, o mais tímido e gentil dos
poetas, uma vez fez escândalo nas ruas do Rio de Janeiro ao ver sua amante de
braço com outro homem. Ele era casado, não tinha esse direito, mas reagiu aos
berros ainda assim – e a moça voltou para ele, pelo resto da vida.
A gente sabe de onde vem essa atitude, não? Há machismo
nela, mas não só. Muitas mulheres se portam de forma possessiva e irracional e
não se pode acusá-las de machismo. Acho mais fácil entender que temos uma
cultura afetiva antiquada, doentia, que autoriza homens e mulheres a sentir-se com
direito sobre o corpo e os sentimentos do outro. Os homens defendem esses
falsos direitos com agressividade e violência, enquanto as mulheres usam formas
mais sutis de controle. A sensação de que o ser amado simplesmente nos pertence
está em todos nós, inclusive homens e mulheres
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